sexta-feira, 18 de abril de 2014

Paixão pela arte, pela luta e pela vida



Paixão pela arte, pela luta e pela vida

 (Artigo de Murilo Silva, publicado no livro "Ademir Rosa: paixão pela arte, paixão pela vida", organizado por Pedro Ucza, em 2007. p. 79 - 80.)

" Já esperei minha vida toda pelos outros. Vou caminhando sozinho.
Até o fim de minhas forças. Até o limite do horizonte. Boa noite". 
                  
                                                    Ademir Rosa

             
                        Sociólogo, ator e militante político, Ademir ultrapassou muito jovem o limite do horizonte no dia 28 de fevereiro de 1997, nos deixando muita saudade. Prefiro, como Schopenhauer, comparar a morte ao pôr-do-sol, que quando se despede já está nascendo em outro horizonte. Independente das crenças, dúvidas e certezas, a luz de Ademir Rosa sempre estará brilhando em nossa memória. Toda boa noite precisa de um bom dia. No limite do horizonte, onde jaz um por de sol, o crepúsculo que se despede é o mesmo que se anuncia. Lembrar de Ademir é iluminar um rosto destacado no cenário que nunca se arruma.
Apaixonado, irreverente e feliz, Ademir seguiu sua vida sempre esperando o melhor das pessoas. Um militante admirado e brincalhão, que externava freqüentemente sua impaciência com a demora das coisas. Voluntarista como poucos, verbalizava com poesia e às vezes com truculência, sua paixão pela política e sua razão pela justiça. Um guerrilheiro na arte e na política. Com sua alma e sua arma, convidava-nos com vigor e entusiasmo para as batalhas da vida. Quando se decepcionava com algum companheiro, rasgava a garganta com sua voz grave e marcante: “Pelego !” . Mas logo também perdoava. Ademir me disse certa vez que sentia saudades quando o PT de Florianópolis cabia num fusquinha. Contrariado com as “reunites agudas” do partido Nas plenárias do PT ele ficava numa coxia imaginária soprando falas e aguardando o momento de atuar. Quando assumia o microfone, armava uma metralhadora de palavras, quase sempre para atingir o alvo preferido: o estreitismo das correntes do partido. “Vamos parar com essas picuinhas, porra!”. Lá vinha o Ademir de novo para sacudir o PT, que naquela época já cabia numa kombi.

Numa tarde de 1994, na Fundação Franklin Cascaes, encontro o Ademir a procura de ingressos do Festival Isnard Azevedo. Queria comprar todas as noites. Eu, que trabalhava na instituição e possuía diversos deles para algumas personalidades, prontamente lhe ofereci as cortesias. Ele, com sincera modéstia, tentando recusar: “Não é melhor guarda-los para alguém mais importante?”.  Numa das últimas vezes em que estive com ele, já bastante doente, sentado numa pedra na Ponta do Sambaqui, seu sorriso tomou conta do rosto preparado para o choro, embalando palavras saudosistas de homenagem à vida. Interrompido por uma lágrima, enxugou rapidamente o rosto magro e aparou uma gota de chuva imaginária, levantando-se apressadamente com a desculpa de que já estava chovendo.    

Um sentinela na política e na arte, tinha postura altiva e estatura acima da média. Uma torre de pedra que na intimidade se descobria feita de açúcar. Pele morena com bochechas às vezes rosadas, seu rosto dócil, metade coberto por barba preta e depois pouco branca, descortinava a imagem de um bizarro Dom Quixote, às vezes de um bravo Che Guevara, outras de um Raul Seixas, mas eu sempre preferi a imagem de um Jesus brasileiro e manezinho. Namorador, estilo Dom Juan, apenas na retórica masculina, pois era mesmo apaixonado por Edilma Rosa, sua linda nordestina.

  Lá está ele, no pôr-do-sol, no limite do horizonte, brilhando em nossa memória, como uma centelha viva e esperançosa, anunciando o fim e o início dos dias. Iluminando rostos, cenários, talentos, lembranças, idéias e admirações, Ademir atua, Ademir vive.  

13 comentários:

  1. Parabéns pelo blog, que eu não conhecia, e também por nos apresentar histórias das pessoas que fazem Florianópolis!
    [ ]'s
    {8¬)
    Shasça

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Grande Shasça, tudo bem? Receber um comentário como este, de você, um dos mais qualificados agitador cultural desta cidade e blogueiro primoroso, já valeu a pena estar "blogado". Abraço. murilo silva

      Excluir
  2. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  3. Por falta de prática acabei excluindo um comentário, o primeira de todos, de alguém (mulher) que acabou não se identificando, a quem registro minhas desculpas. O conteúdo do comentário: " Fiquei muito curiosa Murilo, parabéns!!! ".

    ResponderExcluir
  4. Parabéns querido amigo Murilo por mais essa iniciativa da criação desse blog, pois a meu ver já deveria ser criado há mais tempo!!! Realmente tu és um diferencial no nosso meio político cultural! Abraços e sucessos!!! Frank.

    ResponderExcluir
  5. O ultimo trabalho fe Ademir Rosa aconteceu no Festival Isnard Azevedo em novembro de 1996. Tive o prazer de dirigir e atuar! O elenco tinha Ademir Rosa, Juli Nesi e eu. A apresentaçao aconteceu no Teatro Armação e teve colaboração cenógrafica de Mauricio Muniz!

    ResponderExcluir
  6. Agradeço as palavras e homenagem ai meu tio Ademir Rosa. Pessoa alegre, feliz e brincalhona. Uma pena ter nos deixado tão cedo. Saudade.
    Marcelo Santos

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Seu tio era uma pessoa muito especial. Com certeza seu legado se eternizou na cultura e na arte. Abraço

      Excluir