sábado, 19 de abril de 2014

Encenação

(Texto de Murilo Silva, como Presidente do Fórum Cultural de Florianópolis, publicado em 18/01/2010, no Diário Catarinense, p. 08)


Foto de Caio Antônio
O Teatro-Invisível, vertente do Teatro do Oprimido criado pelo saudoso Augusto Boal, teve início na Argentina para driblar a ditadura. Encenar “sem ator” consiste a magia do invisível. Em Florianópolis a encenação é do opressor, protagonizada pelo executivo, em coadjuvância com o legislativo. Comentarei apenas uma: O Defeso da Bacia do Itacorubi.

Um prefeito, mesmo contando com esmagadora maioria de vereadores obedientes, ao encaminhar um projeto é inesperadamente esmagado. Quatro disciplinados parlamentares votam a favor do derrotado prefeito, que aponta com uma mão a poderosa força da especulação imobiliária, e com a outra tranca na gaveta um decreto em favor do povo.

Vamos agora dar visibilidade a este teatro. Os quatro fiéis escudeiros, favoráveis ao defeso da Bacia do Itacorubi, semanas antes aprovaram a alteração do zoneamento da área da penitenciária, pertencente à mesma Bacia. Os demais, não todos, agradaram os poderosos, e ainda aproveitaram para posar de independentes do executivo. Poucos, fora da encenação, votaram contra o projeto em função de um parágrafo que dava absurdos poderes à Prefeitura: aprovar qualquer construção de interesse social, como um shopping e seus prometidos empregos. Por fim, o decreto que o prefeito não apresentou, respaldado pelo Plano Diretor, poderia suspender por seis meses as construções na Bacia do Itacorubi, dando chance ao debate e à reflexão.

Ao espectador deste insalubre espetáculo – o cidadão oprimido, sem água e  planejamento, engarrafado no carro veloz ou espremido no ônibus – só resta  uma saída: assumir o protagonismo da encenação.  
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