sábado, 19 de abril de 2014

O crime e as crianças no Brasil

(Texto escrito por Murilo Silva, como Secretário de Comunicação do PT / SC, publicado no jornal Notícias do Dia, em 16/11/2011, p. 06)

A proposta de redução da maioridade penal no Brasil recebe grande quantidade de apoiadores no Congresso Nacional. Observamos o crescente número de menores de 18 anos executando crimes.  Respeito a dor de familiares de vítimas fatais, de onde partem legítimas comoções sociais, mas defendo o uso da razão para o enfrentamento deste problema e também as regras constitucionais vigentes.

Parlamentares defensores da proposta de redução, extremamente pessimistas em relação ao futuro, fazem do pessimismo uma ferramenta de opressão e ódio. Vestem-se de justiceiros, mas são carcereiros da esperança e não aprendem que a cólera ofusca o entendimento e cega a razão.

Legisladores republicanos que são, agem como senhores do feudo da verdade, com falsas soluções que escondem uma das facetas mais desumanas do capitalismo. Isentam de responsabilidade o poder público, a família e a sociedade, tripé fundamental que deveria garantir os direitos e os deveres da criança e do adolescente.

A redução da maioridade penal não resultará na diminuição da violência, e sim no seu aumento e na mudança do modus operandi do criminoso, que agirá usando parceiros com 14 anos de idade. Façamos como na África do Sul, onde as crianças de 12 anos já podem ser penalizadas, ou como na Índia onde a idade é de 7 anos? Assim, os criminosos se especializarão em crianças de 6 anos.


Fonte da imagem: http://agenciapapagoiaba.com/
Falsos argumentos alimentam páginas de jornal e relatórios oficiais defendendo a redução proposta. Dizem que nações mais desenvolvidas possuem maioridade inferior à brasileira. A Espanha, a França e a Alemanha possuem em seus ordenamentos jurídicos as responsabilidades penais de 12, 13 e 14 anos, respectivamente. 

No Brasil, a mesma responsabilidade dá-se a partir dos 12 anos de idade, e difere desses países apenas na nomenclatura legal, ou seja, por não usar a palavra penal. Em nosso país, as medidas sócio-educativas aplicadas aos menores já são verdadeiras penas. Deveriam ser medidas para recuperar e reintegrar o jovem à sociedade, mas como penas estão somente reproduzindo o nosso falido sistema penal, que hoje é uma superlotada universidade para o crime.

Além do mais, é importante destacar que as diversas Propostas de Emendas Constitucionais que tramitam atualmente, todas propondo alguma forma de redução da maioridade, são matérias inconstitucionais, uma vez que versam sobre cláusula pétrea (art. 228 da CRFB/88), pois trata-se aqui do princípio da dignidade da pessoa humana, e  de um direito fundamental advindo da convenção das Nações Unidas de Direito da Criança. 

Já reduzimos a maioridade penal. Temos agora que discutir a execução das medidas aplicadas aos menores, de forma a colocá-las realmente na categoria sócio-educativa. A lógica cega que defende a redução da maioridade penal, levada ao seu extremo absurdo e possível, terminará na sala de parto selecionando os bons e os maus homens do futuro. Critérios sociais e raciais estarão entre as balizas de alguns dos justiceiros, como hoje camuflados em  discursos e gestos.

6 comentários:

  1. Concordo plenamente, Murilo. Essas soluções paliativas são pautadas no ódio imediatista da população, e não são um combate efetivo à violência. Até porque, os presídios ja estão lotados e de pouco servem à sociedade, senão para criar campos de concentração de ódio e endurecimento de criminosos, para quando voltarem à sociedade, tenham menos oportunidade como trabalhador e se tornem apenas criminosos endurecidos. Parabéns pela postagem!

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  2. Ótimo texto Murilo! Parabéns! O que precisamos é romper com as estruturas patriarcais que ainda dão o norte nas diversas áreas e políticas sociais. Hoje, com absoluta certeza, temos o Congresso Nacional mais conservador dos últimos tempos onde, ao invés de avançarmos em direitos humanos e conquistas democráticas, estamos retrocedendo.

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  3. Costume dizer, ninguém nasce criminoso, bom ou ruim, temos que mudar é a sociedade, onde a justiça seja uma regra igual para todos, onde todos tenham acesso, mas sem "precisar" cometer crimes por questões de falta de oportunidade, de uma vida digna e não em meio a tantas injustiças sociais, condições que favorecem os crimes principalmente decorrentes do narco tráfego e também das drogas legais como o alcool que corrobora com o crescimento da violência no trânsito, etc. Portanto, antes de falar em redução da maior idade penal, temos que ter a coragem de enxergar as desigualdades sociais, a falta de oportunidade e o acesso a uma educação de qualidade, inclusive para mudar a qualidade do voto e consequentemente eliminar os políticos reacionários e oportunistas que vivem as custas da desgraça alheia. Abaixo a hipocrisia!

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  4. Puta que pariu! Se já tinha admiração pelo pouco tempo q trabalhamos juntos depois doque li fico lisongeada de te ter como amigo. Me deu até vontade de militar novamente, por um país q acredito. Por mais igualdade. Pq na sinceridade? Ultimamente tenho visto discursos petistas q tenho vontade de vomitar... Parabéns pelo texto Murilo e espero q vc me represente nessa luta pois concordamos no pensamento. Espero tb que suas palavras sejam condizentes com seus atos. Só o fato de se expor no jornal se posicionando já merece meu voto.

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  5. Excelente texto. Além de ressaltar a responsabilidade constitucional de toda a sociedade com a infância e adolescência, ainda esclarece que já existe a legislação que impõe medidas sócio educativas para maiores de 12 anos, que caso existissem de fato, poderiam ser ferramentas transformadoras de tristes para felizes realidades.

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    1. Obrigado, Christine. Um assunto que devemos sempre abordar para diminuir a fúria preconceituosa dos justiceiros de plantão. Abraço.

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